sábado, fevereiro 24, 2007

Tardes de Julho

Tardes nubladas de fina garoa,
Tardes geladas de sombras, granizo,
Tardes doridas, de lembranças vagas...
Vaga saudade que ressuma, ecoa,
Retratos difusos de amores vãos.
De onde me vem agora esse sorriso?
És tu Joana que me afagas?
Teu riso fere, magoa...
És tu que meu peito rasgas?
Por entre véus te diviso,
E então foges, negas-me as mãos.
Por certo, vingas radiante,
A mão negada na manhã distante

Mãos de neve, de olor jasmim,
Sinto agora nos cachos grisalhos.
Certamente, és tu Mariana
Que, há muitos anos, te foste de mim,
E nos desvãos dos meus sutis atalhos
Sorvi o travo da saudade insana.
Mas, sinto trêmulos teus róseos dedos
Anda, querida, conta teus segredos!

Mas foges, também, nas brumas...
E então me roça a face um beijo,
Um lábio antigo que supunha morto
Nos arraiais da mocidade. Espumas
Borbulhantes de febril desejo.
Nancy: farol, jangada e porto.
Por que te foste? Não me lembro mais.
E agora, meu amor, por que te vais?

Ah! Esse perfume, esse fragor de rosas,
Esse calor que me aquece e acalma,
Esse desvelo em me abraçar, gentil...
Evocações de Dora, faces vaporosas,
Por entre os véus que me descerram a alma
E os velhos becos do meu peito frio
Já rola, agora, o pranto aos borbotões,
Do meu passado a remontar visões.

Meu Deus! Quem canta essa canção tão linda?
Que voz é essa que me leva ao céu?
Que me arrebata de saudade e dor?
És tu, Cinira? Amas-me ainda?
Acaso vens cobrar meu vil papel?
Pois saibas que fui eu o perdedor.
Mas fica, canta, dá-me teu perdão!
Ainda tens meu nome em teu cordão?

Debalde imploro. As sombras vêm e vão
Marília dança, Adélia brinca, Lina chora
És tu, Helena, que recita um verso?
Será Diana, com seu violão?
Mas qual! Tudo é silêncio agora!
Sons confusos e um lembrar perverso,
Som perverso, confusa visão.
Qual órfão da vida, cismo e choro,
E sem saber o quê, a Deus imploro.

Que fiz da vida, meus amores?
Que fiz dos beijos, das promessas?
Onde as Marias, as Caróis, as Teresas?
Quem me diz de suas vidas, suas dores?
Foram-se todas, menos essas
Loucas faces, frias de tristezas...
Faces tristes, vivas de rubores.
Odores, fumo, ácool, quais miasmas,
Sombras, vozes, nomes, mil fantasmas.

Mas vem a noite e traz Aldebarán
E tudo leva num arrastão fatal:
Mãos, silhuetas, rostos, risos,
Sombras fugazes da fugaz manhã,
Saudosa, alegre, do meu carnaval,
De fantasias e enganosos guisos,
Guisos vistosos de uma vida vã.
E não bastara o frio e a dor letal,
Inda me assaltam, vagos e imprecisos,
Os acicates acres da moral cristã.
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(Brasília, jul/2005)

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