quinta-feira, janeiro 04, 2007

O Retorno do Velho Índio

Depois de me afundar em todos os charcos,
Depois de me perder em todos os barcos
E de me esgueirar pelos becos sombrios,
Pelas esquinas escuras, pelos botecos frios
E de buscar vida nas bocas,
Buscar amigos nas tocas,
Nos soturnos encontros,
Nas vielas, nos pontos;

Depois de me exaurir, sem vida, exangue
E me chafurdar na lama do lodo do mangue;
De beber vinho nas choupanas toscas
E de ser rei dos bêbados e das moscas;
Depois da busca louca, desvairada,
Descubro, enfim, que não buscava nada...

E o que restou no fim do fogo do pavio
Foram essas cãs e um colossal vazio.
Escuridão dos breus,
Cansaço e solidão.
A solidão de estar sozinho, solidão do adeus,
De pensar na morte...
A grande solidão de Deus?
E voltei.

Não a volta fúnebre dos arrependidos,
Tristes e humilhados e perdidos.
Voltei volta ansiosa e firme,
Como inseto em busca de luz,
Pedro em busca de Jesus.

Porque sei que na vida que deixei pra trás,
Há um coração sereno que perdoa,
Uma oca que vive e sofre em paz,
E mãos que me esperam numa boa.

Voltei como quem segue um mapa,
Como o descuidado que esqueceu a capa;
Como quem refaz caminho
E busca estrada mais curta,
Galho mais ancho pro ninho.

Enfim, voltei pela lei:
"Nem o peão se sustenta,
Se lhe falta o estribo,
Nem o velho índio agüenta,
Se lhe falta a tribo".
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(Poesia escrita em 1988. O homem que não comete erros, sem dúvida é inteligente. Mas o que reconhece os próprios erros, com certeza é sábio.)

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