quarta-feira, janeiro 17, 2007

Contramão

E porque todas as coisas têm que ter limites,
A esperança também reclama horizontes:
Um ponto que seja, distante como a eternidade,
Como entre a vida e a morte, uma breve ponte.

Meu canto está assim, desgovernado e tonto
Metido em vãos e ruas sem saída.
Sustentado nos fios da paciência muda,
Até que se esgotem, paciência e vida.

Por que amei, meu Deus, se me dói tanto?
Tive filho e filha, mas não tive paz...
Sonhar... Pra quê? E o desencanto?
Pra acordar febril,
E morrer de dó,
E sofrer mais?

Chove e compreendo, por desdita,
Que a chuva é castigo ao desabrigado,
Pra deixar a alma inda mais aflita.
Pra que lembranças do passado?
Já tenho o meu fardo, que carrego só.
Já tenho meu tango, meu fado, meu cálix de fel
E o peso de chumbo do silêncio,
E o travo amargo desta dor fiel...

É vida andar assim sem tempo e sem rumo,
Só a solidão?
É morte não poder dormir, enfim, em paz,
Na escuridão?

E sigo só, por um deserto escuro,
Estradas antigas, já sem sul ou norte,
Entregue às forças cruas da fatalidade.
Quem sabe a pagar contas de um viver impuro?!

Mistura indefinida, nem vida nem morte,
Cambaleante e cego, doido de saudade,
Na contramão da vida, buscando o passado,
Depois de morrer mil vezes no futuro.
...................................................................................
(Poesia escrita em Manaus-AM, fev/87. Na fragilidade, o futuro apavora).

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