Zanata, nome fictício, era daquelas pessoas que costumo chamar de artífices das palavras. É que ele rebuscava seus discursos com raciocínios e frases tão inusitadas que, muitas vezes, escapavam ao entendimento dos mortais comuns. Só para o leitor ter uma idéia, aqui vai uma tirada dele, ao fazer breve intervenção, para saber a pauta de uma determinada reunião:
- Que me desculpem os preclaros, mas conforme reza a dialética determinista pitagórica, reafirmada pelo gongorismo secular de Dennis, os fins podem justificar os meios, mediante certas circunstâncias especiais, levando-se em conta o momento histórico e blá-blá-blá... De modo que seria muito bom se todos soubéssemos, com a devida antecedência, qual é a pauta da porra dessa reunião.
Todo mundo ria de sua erudição incompreendida e ele achava o máximo. Certa vez, numa daquelas intermináveis reuniões preparatórias para a constituição da Coordenação Nacional das Associações de Empregados, CONAE, em Brasília, 1984, Vergílio presidia a Mesa, quando o Zanata fez o seguinte discurso, após o assunto em pauta já ter sido decidido e votado:
- Confúcio, em sua sabedoria milenar, nos legou que o tudo e o nada se confundem nas mentes dos incautos. Nunca é demais ressaltar que o definitivo não existe e que tudo transita de um pólo ao outro, inexorável e imperceptivelmente, deixando em nós o vazio da incompreensão e do niilismo nefasto. Ainda ontem, numa de minhas comunicações telepáticas com as comunidades que habitam o núcleo do nosso orbe, tomei conhecimento da existência de um metal que ainda vai ser descoberto pelo soberbo e ignorante Homem e que vai revolucionar o pensamento ocidental, contaminado pelos resíduos cúpricos dessa civilização materialista e blá-blá-blá...
Todos se olhavam estupefatos. Que diabos Zanata queria dizer?
Vergílio, sangue italiano esquentado e impaciente e, como todos nós, sem entender nada daquilo e ainda, diante do pouco tempo para a pauta enorme, interrompeu o discurso, daquele seu modo Vergílio de ser:
- Zanata, por favor! Seja objetivo, porque o assunto já foi encerrado. A Mesa lhe dá 30 segundos pra encerrar sua fala.
Zanata “queimou as priquitas”, como se diz na minha terra:
- Não aceito imposições da Mesa reacionária e autoritária! Assim falou Zaratustra!
Vergílio perdeu o restinho de paciência que lhe sobrara:
- Cala a boca Zanata! Isso é coisa de pelego!
Zanata teve uma reação inesperada. Partiu pra cima do Vergílio... Tivemos que intervir para evitar uma contenda física. Enquanto ele babava, vociferando maldições eruditas, Vergílio ria, provocando ainda mais ira do agressor.
Um providencial intervalo, com cafezinho e água gelada, acalmou a situação, restabelecendo a serenidade ao ambiente.
Mas, no retorno dos trabalhos, Zanata veio com um dicionário na mão, que ninguém sabe onde ele conseguiu, e pediu uma questão de ordem, para ler aos presentes o significado etimológico da palavra pelego:
-Aquela membrana finíssima que liga a asa ao corpo do morcego...
Tivemos que segurar o Vergílio, porque agora era ele que queria partir para cima do Zanata, que ria, descontando a provocação.
Mais tarde, já quase no encerramento dos trabalhos, Vergílio fez um comentário de que havia colegas que vinham despreparados pra reunião, sem fazer as necessárias discussões prévias, trazendo apenas posições pessoais. Vestindo a carapuça, Zanata levantou-se e, ante a apreensão do plenário, avisou:
- Não se preocupem. Estou calmo.
Encaminhou-se lentamente para a Mesa, onde Vergílio se encontrava impaciente, mas contido. Com o braço direito estendido, o indicador apontando para frente, ele avançou em câmara lenta, causando expectativa geral na platéia. Ao chegar ao limite do dedo alcançar o rosto do surpreso Vergílio, parou e ficou cerca de 30 segundos encarando o opositor, que se manteve firme. No plenário, todos nos preparamos para nova intervenção, temendo um quebra-quebra no auditório. De repente, Zanata infla-se, como um sapo cururu, e dispara, cuspindo saliva no rosto do Vergílio:
- Maldito italiano, maldito, maldito! Mil vezes maldito! Enforque-se em suas próprias palavras!
E voltou-se, tranqüilo, para seu assento. Vergílio retomou a pauta e a reunião prosseguiu em paz.
- Que me desculpem os preclaros, mas conforme reza a dialética determinista pitagórica, reafirmada pelo gongorismo secular de Dennis, os fins podem justificar os meios, mediante certas circunstâncias especiais, levando-se em conta o momento histórico e blá-blá-blá... De modo que seria muito bom se todos soubéssemos, com a devida antecedência, qual é a pauta da porra dessa reunião.
Todo mundo ria de sua erudição incompreendida e ele achava o máximo. Certa vez, numa daquelas intermináveis reuniões preparatórias para a constituição da Coordenação Nacional das Associações de Empregados, CONAE, em Brasília, 1984, Vergílio presidia a Mesa, quando o Zanata fez o seguinte discurso, após o assunto em pauta já ter sido decidido e votado:
- Confúcio, em sua sabedoria milenar, nos legou que o tudo e o nada se confundem nas mentes dos incautos. Nunca é demais ressaltar que o definitivo não existe e que tudo transita de um pólo ao outro, inexorável e imperceptivelmente, deixando em nós o vazio da incompreensão e do niilismo nefasto. Ainda ontem, numa de minhas comunicações telepáticas com as comunidades que habitam o núcleo do nosso orbe, tomei conhecimento da existência de um metal que ainda vai ser descoberto pelo soberbo e ignorante Homem e que vai revolucionar o pensamento ocidental, contaminado pelos resíduos cúpricos dessa civilização materialista e blá-blá-blá...
Todos se olhavam estupefatos. Que diabos Zanata queria dizer?
Vergílio, sangue italiano esquentado e impaciente e, como todos nós, sem entender nada daquilo e ainda, diante do pouco tempo para a pauta enorme, interrompeu o discurso, daquele seu modo Vergílio de ser:
- Zanata, por favor! Seja objetivo, porque o assunto já foi encerrado. A Mesa lhe dá 30 segundos pra encerrar sua fala.
Zanata “queimou as priquitas”, como se diz na minha terra:
- Não aceito imposições da Mesa reacionária e autoritária! Assim falou Zaratustra!
Vergílio perdeu o restinho de paciência que lhe sobrara:
- Cala a boca Zanata! Isso é coisa de pelego!
Zanata teve uma reação inesperada. Partiu pra cima do Vergílio... Tivemos que intervir para evitar uma contenda física. Enquanto ele babava, vociferando maldições eruditas, Vergílio ria, provocando ainda mais ira do agressor.
Um providencial intervalo, com cafezinho e água gelada, acalmou a situação, restabelecendo a serenidade ao ambiente.
Mas, no retorno dos trabalhos, Zanata veio com um dicionário na mão, que ninguém sabe onde ele conseguiu, e pediu uma questão de ordem, para ler aos presentes o significado etimológico da palavra pelego:
-Aquela membrana finíssima que liga a asa ao corpo do morcego...
Tivemos que segurar o Vergílio, porque agora era ele que queria partir para cima do Zanata, que ria, descontando a provocação.
Mais tarde, já quase no encerramento dos trabalhos, Vergílio fez um comentário de que havia colegas que vinham despreparados pra reunião, sem fazer as necessárias discussões prévias, trazendo apenas posições pessoais. Vestindo a carapuça, Zanata levantou-se e, ante a apreensão do plenário, avisou:
- Não se preocupem. Estou calmo.
Encaminhou-se lentamente para a Mesa, onde Vergílio se encontrava impaciente, mas contido. Com o braço direito estendido, o indicador apontando para frente, ele avançou em câmara lenta, causando expectativa geral na platéia. Ao chegar ao limite do dedo alcançar o rosto do surpreso Vergílio, parou e ficou cerca de 30 segundos encarando o opositor, que se manteve firme. No plenário, todos nos preparamos para nova intervenção, temendo um quebra-quebra no auditório. De repente, Zanata infla-se, como um sapo cururu, e dispara, cuspindo saliva no rosto do Vergílio:
- Maldito italiano, maldito, maldito! Mil vezes maldito! Enforque-se em suas próprias palavras!
E voltou-se, tranqüilo, para seu assento. Vergílio retomou a pauta e a reunião prosseguiu em paz.
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