quarta-feira, outubro 31, 2007

Filosofando em Goianésia

Todos têm suas manias. Eu também.
Quem trabalhou comigo, nos meus tempos de martelo, sabe que na primeira página de minhas cadernetas de campo, sempre escrevia uma frase estimulante ou filosófica, ou um verso inteligente, ou um ditado popular. Não me perguntem por quê. Como já disse, mania. Para mim, amenizava a leitura de umas tantas descrições insossas de afloramentos. Outras vezes, lá no meio das páginas, inseria a letra de uma música de que vinha tentando me lembrar, há tempos e que, justamente quando descrevia um maciço granítico, me aflorava que era uma beleza. Então, tinha de registrar, e assim o fazia. É engraçado, por exemplo, ler, lá pelas tantas, a seguinte página:

Afloramento RL-115: Margem esquerda do córrego Pindorama. Matacões graníticos com avançada esfoliação esferoidal, cinza-claro, grã média... “Serenata (Capiba): Levo a vida em serenata, somente a cantar. Quem não me conhece tem a impressão de que eu sou tão feliz, mas não é isso não. Se eu canto em serenata é para não chorar...” Textura porfirítica, medianamente alterados, de aspecto homogêneo...

Conseguiu entender?
Mas tergiversei. Quero falar dos textos de abertura das minhas, amareladas e sujas de terra, cadernetas de campo. Meus colegas achavam interessante essa minha mania e às vezes pediam pra ver a “atual”. Certa vez, por não me lembrar de nada que valesse a citação e por falta de material para consulta, sapequei o seguinte verso, numa manhã de segunda-feira de ressaca:

“Páginas limpas,
Imaculado banco:
Sois o inverso
De um cabelo branco (RL)”

Não sei por que cargas d’água, o Adão* se encantou com essa brincadeira poética e depois de copiar para a sua caderneta, atentou para o RL e se admirou:
- Não vai me dizer que o verso é seu!!!
- Claro que não! Quem me dera ter tão elevada inspiração!
Como eu sabia que o Adão era tão ignorante em matéria de filosofia quanto eu, soltei esse verdadeiro crime de lesa-cultura mundial:
- Esse verso é do grande filósofo e poeta pré-revolucionário francês, Regis de Lion. Já ouviu falar?
- Claro... Isso é dele? Esse verso eu não me lembro de ter visto... Mas é de uma beleza lírica tocante.
Ah! Frágil natureza humana!
Nunca desfiz a mentira e nunca mais voltamos ao assunto, de modo que, para todos os efeitos, Regis de Lion povoou, por algum tempo, o universo romântico do meu amigo. Isso é real, não é nenhuma mentira.
Outra vez, estava na cidade de Goianésia, em happy hour com os anfitriões da mineradora Unigeo, na varanda elevada de uma dessas casas típicas de interior, com jardim na frente. Enquanto deliciávamos uísque, cerveja, cachaça de Minas, tira-gostos e canapés, resolvendo os problemas do mundo, uma algazarra na rua chamou-nos a atenção. Um bando de meninos provocava um desses doidinhos que tem em todo o interior, com palavras de ordem que faziam o ofendido brandir impropérios e avançar sobre a turba, que, por sua vez, se deliciava e redobrava as ofensas.
O doidinho era uma figura de idade indefinida, barbuda, esquelética, cabelos negros desgrenhados, torso nu, calça amarrada na cintura por uma corda. Depois que escorraçou a garotada com um pedaço de pau e com a intervenção de um dos pais, ficou imóvel, sob imensa mangueira da alameda, cofiando a barba e olhando para o céu, como se tentasse distinguir algo especial, de difícil visibilidade. Após um bom tempo nessa contemplação, baixou as vistas e passou a contemplar o chão a seus pés. Nessa posição se demorou mais outros tantos minutos e, por fim, saiu caminhando calma e lentamente, atravessando a rua em nossa direção. Era tão magro que dava pra contar suas costelas.
Em frente à casa onde nos achávamos, havia um tambor de lixo, sob um fícus de copa larga e sombrosa. Ali, bem na nossa frente, que o olhávamos do alto da varanda, o doidinho fez nova parada contemplativa, fixando o lixo. Depois do exame externo do conteúdo, com a vara que espantara as crianças, remexeu-o profunda e longamente, como se procurasse algo específico. Revirou tudo, com meticulosa atenção. Em determinado momento, debruçou-se sobre o tambor e aspirou o cheiro exalado. Repetiu o gesto várias vezes e, por fim, virou-se em nossa direção. Anunciaria o veredicto do exame.
Mirou-nos sem pressa, sem deixar de cofiar a barba. Avaliou cada um de nós, com um olhar superior e perscrutante. Quando julgou-nos convenientemente avaliados, posicionou-se como um orador no púlpito, brandiu a vara na mão direita e falou, alto e bom som, como moderno Conselheiro:

“Estão jogando gente no lixo. Precisamos organizar essa limpeza.”

E mais não disse e nem foi preciso. Com seus passos calmos subiu a rua e desapareceu. Foi filosofar em outra freguesia. Mas suas palavras ficaram ali, ecoando em nossos ouvidos. E não sei dizer por que, as gravei indelevelmente e as transcrevi para a abertura de uma das minhas cadernetas, colocando entre parênteses as inicias DG. Para mim, significavam Doidinho de Goianésia. Mas, quando o Adão viu e se maravilhou e perguntou quem era DG, não resisti:
- Essa frase é do grande filósofo grego pré-socrático, Diógenes de Gorgias. Claro que você conhece, né?
- Claro, claro. Mas, sinceramente, é uma das reflexões mais profundas que já vi sobre a natureza humana.
Adão passou para o andar de cima, sem que eu tivesse a oportunidade de desfazer mais essa pegadinha lítero-filosófica. Quando nos reencontrarmos, tenho certeza de que ele me perdoará.
Por minha vez, confesso que inúmeras vezes me debrucei sobre essa máxima, sem conseguir extrair, por inteiro, seu real significado. Porém, algo lá no fundo me diz que há nela uma sentença filosófica muito acima da minha capacidade de entendimento. Sinto-me aliviado hoje, quando revelo o esquelético frasista de Goianésia, compartilhando a lição que ele tentou nos passar, naquele inesquecível fim de tarde. E ainda longe de alcançar sua mensagem, pergunto-me, do alto da minha pequenez: afinal, nessa sociedade de valores voláteis e volúveis, quem é doido e quem é normal?
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* Nome fictício

terça-feira, outubro 16, 2007

O Sonho de dona Alquinã

De todos os tipos de jornada de campo, nada há que se compare, em desgaste e aventura, ao trabalho que exija avançar e acampar todos os dias. Isso acontece pela injunção de dois fatores: inviabilidade da área e escala de trabalho. Todos os dias levantando acampamento de manhã e baixando no final da tarde. Primeiro, há que se ter uma logística complexa, com uma equipe só para coordenar o deslocamento. Segundo, o geólogo tem de prever o local do possível acampamento, sem nunca ter estado na área, passar a localização para a equipe de rancho e programar seu perfil, de modo que tudo bata no final da tarde, sem atropelos. Uma bobeira, e a confusão estará instalada, o desencontro consumado. E tudo isso a pé, levando a tralha nas costas. Evidentemente, nem tudo sai como planejado. Surpresas acontecem com freqüência.
Foi assim, numa campanha desse tipo, que um dia chegamos a um rancho de palha, tipo oca indígena, bem no sopé da serra do Cabeças, na tríplice divisa Bahia, Goiás (hoje Tocantins) e Piauí, às margens de soberbo riacho de águas cristalinas e geladas. Além da minha equipe, de geologia e recursos minerais, havia a turma da geoquímica, comandada pelo Adão*, que Deus o tenha! Marcou-me muito esse dia, porque era véspera do meu aniversário. Como já estávamos no limite da área, resolvemos fazer base ali pelos dois dias seguintes, pois não havia a menor condição de levar o acampamento para o alto da serra, tanto pela dificuldade logística, quanto pela improdutividade de tal sacrifício, já que seu topo mais se assemelhava ao deserto do Saara. De sorte que, depois de vários dias, iríamos dormir duas noites seguidas no mesmo local e isso precisava ser comemorado. E o pretexto foi meu aniversário.
Antes de prosseguir, apresento-lhes o casal seu Jove e dona Alquinã. Pelo menos, foi isso que entendi e é o que tenho registrado em meus apontamentos. Dois caboclos de idade indefinida, certamente descendentes de índios, pelas feições e costumes. Precocemente envelhecidos, mas ambos ainda muito saudáveis. Ele, de uma cordialidade quase servil, torso nu, sorriso sempre presente no rosto vincado pelo sol. Ela, tímida, mas gentil, chitas mínimas sobre um corpo magérrimo, uma longa trança no cabelo, cachimbo na boca, uns olhos de ciganos e a pele de bronze, cobreada pelo sol do Centro-Oeste. Dos filhos, pouco posso dizer. Nem sei quantos eram. Sei que eram muitos, a maioria do sexo masculino e certamente menores de dez anos. Quando ouviram o barulho de nossa aproximação, correram para os matos, nos contou seu Jove. Usavam algo indecifrável entre um calção frouxo e uma tanga. Ambas as mãos cobrindo os rostos, levaram todo o tempo de nossa presença ali, a sorrir, nos apontando.
Moravam numa espécie de praça, uma clareira no cerrado denso, bem no pé da serra. Criavam porcos domésticos, caititus, capivaras e aves de todo tipo, inclusive patos e guinés. Alimentavam-se de sua cultura de subsistência: mandioca, milho, feijão e derivados. Sazonalmente, colhiam pequi, cajuí, mangaba, puçá, catolé, ouricuri, manga e cagaita. Não dependiam da cidade pra nada.
Já havia um procedimento padrão para a montagem desses acampamentos relâmpagos. Em questão de minutos, os peões cortavam forquilhas e varas e com a ajuda de lonas e palmas, improvisavam um imenso galpão, onde toda a equipe, de uma dezena de pessoas, estendia suas redes. Outro barraco menor era montado, para a guarda do material e a cozinha.
Na primeira noite, ficamos surpresos quando seu Jove trouxe uma rede e se aboletou conosco, contando casos e dando risadas até tarde. Éramos a primeira visita que ele recebia, em meses, e não deixaria passar a ocasião, sem tirar dela o máximo proveito. Na conversa dessa noite, ele disse que dona Alquinã cozinharia para nós e que não nos preocupássemos porque ela conhecia todos os segredos da boa culinária. Claro que não falou nessa linguagem.
No outro dia cedo, deixamos os insumos culinários com dona Alquinã (arroz, charque, óleo e sal) e nos mandamos para enfrentar a serra do Cabeças. Levei os cozinheiros também, já que eles estavam de folga da cozinha. Querendo me surpreender, Adão entregou à nossa cozinheira uma lingüiça especial, do interior de Minas, que ele trouxera especialmente para esse dia. Era pra ela preparar à tarde, na nossa chegada. E assim se deu.
Cinco horas da tarde, logo que chegamos, Adão reuniu todos no centro do barraco, ofertou um garrafão de cachaça, do qual nunca se separava, cantou Parabéns e mandou vir os quitutes, antes do jantar.
Primeira surpresa: o que de manhã era uma apetitosa lingüiça vermelha era agora uns gravetos escuros, irreconhecíveis. Olhamos “praquilo”, olhamos uns para os outros e a cachaça começou a rodar. Como Adão era prevenido, não perdeu tempo. Deixou que a família anfitriã devorasse os “gravetos” e abriu umas tantas latas de sardinha, de sua reserva especial, temperando com farinha e pimenta. Verdadeiro manjar dos deuses naquelas circunstâncias. Estava salva a festa.
Mas, tudo que é bom dura pouco. Fim de festa, hora do jantar. Segunda surpresa: o arroz estava com um aspecto esverdeado, pastoso, bem diferente do que estávamos acostumados. Pra falar a verdade, o gosto não era ruim, mas era muito exótico, um tanto amargo. Enfim, o tempero era algo completamente novo para nós. Com diplomacia fomos esclarecendo as coisas.
O fato é que dona Alquinã usava seus próprios temperos. Óleo era banha de porco ou caititu e no mais, jogava umas folhas na panela que tinham a função de salgar e dar o sabor exótico. Não usou o sal. Ela não deixava o arroz secar completamente, segundo disse, para “guardar” mais o tempero. Até os ovos que nos preparou de manhã, foram fritos em óleo artesanal de pequi, daí termos estranhado o sabor, mas, verdadeiramente delicioso.
Pois é. Aquela família vivia ali isolada do mundo. Tinham vizinhos sim, outros grupos familiares espalhados pelo pé da serra do Cabeças. Estavam perfeitamente situados no calendário. Costumavam fazer encontros festivos e algumas vezes iam à "cidade" – Almas, um povoado remanescente de quilombo a 20 km dali – vender excedentes de mandioca e farinha e comprar roupas, basicamente.
Conforme planejado, dois dias depois era hora de levantar o acampamento. A turma da logística saiu, mal o dia clareou. As equipes técnicas deram um tempo e quando finalmente chegou nossa hora, chamei dona Alquinã e seu Jove, para lhes pagar duas diárias de cozinheira e guia local. Para minha surpresa, eles se sentiram ofendidos e não quiseram receber de jeito nenhum. Tinha sido um prazer nos receber em seu rancho e só lamentavam por não ficarmos mais tempo. Mas, diante da minha insistência, dona Alquinã me fez uma proposta, surpreendendo seu Jove e me comovendo bastante.
- Seu Reginaldo, dinheiro eu não aceito porque isso aqui pra nós não tem valor nenhum. Mas se o quiser me dar um presente eu aceito.
- Claro. Dona Alquinã, pode pedir.
Falei aquilo quase maquinalmente, sem atinar com o que ela pudesse querer. Num átimo, pensei no meu relógio, no rádio portátil, ou algum equipamento de cozinha. Vi que todos estavam surpresos e curiosos, principalmente seu Jove, que lançou um olhar de reprovação pra esposa. Naturalmente, ele não tinha a menor idéia do que se passava na cabeça da mulher. Esta, com uma timidez tocante, as vistas baixas e as mãos juntas, nervosamente na frente, declarou, finalmente seu desejo:
- Bom, desde que casei, eu sempre quis ter uma toalha de banho bonita, como uma que comadre Marta tem... Vi a toalha que o senhor estendeu na cerca, achei linda e se quiser me dar, será a realização de um sonho, mas se não puder não tem nenhum problema.
Antes de responder que claro, que lhe daria a toalha, refleti sobre a relatividade dos valores. E agradeci a Deus, por poder realizar um sonho.
Dei minha toalha a dona Alquinã e nunca vou esquecer o brilho dos seus olhos, quando me agradeceu e o modo como saiu com o presente sobre o peito, cheirando e acariciando seu sonho. Adão, na seqüência ofereceu a dele a seu Jove, que não teve o mesmo entusiasmo, mas ficou agradecido também.
E partimos para as agonias do novo dia, deixando pra trás aquela gente esquecida das estatísticas.
Dizem que a felicidade são momentos. Pois naquele 04 de outubro de 1979, seis e trinta da manhã, eu vivi essa experiência fugaz. Na última volta da trilha, olhei pra trás e vi dona Alquinã, no terreiro do rancho, com a toalha estendida sobre o corpo, sorrindo e passando a mão no tecido felpudo, como uma garotinha curtindo sua primeira boneca. Parecia em êxtase e talvez até estivesse mesmo. Vi um momento feliz, minha amiga e meu amigo. Tenho as sambaíbas, os pequizeiros e as escarpas da serra do Cabeças por testemunhas. E mais não precisa.
Existirão ainda a toalha, dona Alquinã e seu Jove? Não sei. Nunca mais voltei àquele fim de mundo. Mas sei que aquele fim de mundo nunca saiu de minhas gratas lembranças. E agradeço a Deus o privilégio de ter sido geólogo de campo e de conhecer um pedacinho de Brasil que o Brasil nem desconfia que existe!

quarta-feira, outubro 03, 2007

Estúpido espelho

Ontem fiz aniversário.
Sabe quantos?
Muitos! Muitos anos...
Tantos, que já não os conto mais nos dedos.
Mas, enfim, hoje acordei mais velho.
Se mais não fosse, o espelho não mente.
Bigode chinês, pés-de-galinha, rugas na testa,
E os teimosos fios grisalhos...
O inatingível Tempo a nos lembrar
A finitude e a urgência da Vida.
Na verdade, tenho um ano menos de vida.
E o que isso significa?
Não sei... Quem saberá?
Eis a pergunta que rola,
Desde o tempo das cavernas
Afinal, qual é o grande Mistério?
Qual é o fio que liga passado, presente e futuro?
O espelho me cobra.
Não sei se vivi bem, se mal vivi... Não sei.
Se me permitem,
Tenho sido um desastre.
Não que tenha feito planos mirabolantes,
Mas sempre vivi papéis chinfrins,
Em histórias alheias.
Nunca fui protagonista...
Fingindo aqui, ajeitando ali,
Tocando em frente... É isso.
Ao sabor dos ventos,
Mascarando as frustrações nos vapores das noites insones,
No calor do trabalho insano,
Na frieza de amores mundanos.
Mas tergiversei e a pergunta não quer calar:
“E a vida, o que é, diga lá meu irmão?!”
Não sei se o poeta obteve a resposta.
Cá pra mim, sou cheio de dúvidas,
Mas vejo a natureza tão bela e tão simples,
Os animais sem complicação, seguindo seus instintos.
Vejo a beleza do pôr-do-sol e do amanhecer,
E pressinto que o grande Mistério está aí, à nossa vista,
Bem à nossa frente.
Mas não para ser desvendado,
Esse é o Segredo.
O Mistério da vida é para ser sentido, respeitado.
Entendê-lo, decifrá-lo, não é da nossa competência,
Que não somos deuses.
A inteligência devassa os reinos da ciência;
O instinto ratifica as leis atávicas da evolução,
Mas só a intuição explora o campo dos sentimentos superiores,
Carentes de lógica, para a inteligência,
Inalcançáveis para o primarismo dos instintos.
Então retorno ao começo:
Hoje estou mais velho,
Isso é bom ou ruim?
Não sei.
Venci um câncer,
Mas a que custo?
Tudo tem um preço... Não me iludo.
E daí? A pergunta persiste.
Meus instintos só retornam indiferença.
Minha inteligência pede insumos que não tenho,
Logo, ela não processa.
Mas minha intuição se apresenta.
Ela diz que as rugas e os fios grisalhos
São ponteiros do relógio,
Não do tempo que se foi,
Mas do que falta.
São alarmes a me inquietar:
O que és?
O que queres?
Que fizeste?
És feliz?
Que te falta?
Vai à luta, que o dia de hoje pode ser o último!
Queixas-te da tua vida e o que fizeste para mudá-la?
Escreve tua história, cara!
Reage! Ainda é tempo!
....................................
Mas, como dizia, ontem fiz aniversário.
E cortei um bolo,
E soprei muitas velas,
E bebi muitas cervejas,
E me embriaguei de brigadeiros,
E me empapei de empadas,
E me atochei de coxinhas,
E quando todos se foram,
Dormi como um tronco,
E ronquei como um bronco,
E acordei morto,
De certeza, todo torto,
E corri ao banheiro,
E me vi no espelho
E perguntei:
- Amigo, amigo meu, como estou?
E ele, cruel e gozador:
- Um barrigão imenso,
- Uma ressaca infeliz,
- Mas essa afta na ponta da língua está um charme!
.........................................
Quantos anos fiz?
Muitos! Muitos anos...
Tantos, que já não os conto mais nos dedos.
O passado ficou debaixo dos meus segredos.
O futuro se esvai nos cachos dos meus cabelos.
E o presente é o escracho desse estúpido espelho.

Brasília, 03/10/2007