quarta-feira, julho 18, 2007

Juruna fez escola

Na década de 90, as empresas e organizações governamentais, no Brasil, foram tomadas de assalto pelo Programa de Qualidade Total – PQT. Foi uma verdadeira febre epidêmica. Era PQT pra lá, PQT pra cá, um inferno. Empresa que não tivesse seu comitê de PQT tava ferrada, fora do mercado. E tome executivo viajando pro Japão, e tome japonês chegando por aqui pra ensinar brasileiro a otimizar a rotina do cafezinho, essas coisas. Mas enfim, a CPRM não poderia ficar de fora dessa inovação gerencial e tivemos, também, nosso momento de glória. E foi comitê aqui, subcomitê acolá, núcleos, grupos de trabalho, coordenação nacional, supervisor de qualidade, brainstorm a torto e a direito, instrutor, consultor, cliente, parceiro, um pandemônio.
Se você reclamasse do boy, porque a correspondência fora entregue na sala errada, ele convocava o subcomitê de tramitação de documentos para um brainstorm de emergência, visando a se elaborar uma “espinha de peixe” com a solução do problema. Uma beleza! Em menos de um mês, o comitê submetia um projeto de mudança de rotina à Diretoria Executiva, após um workshop em cada regional.
E tinha o tal do 5S, que era um processo de limpar mesas, gavetas e armários de papéis velhos inservíveis. Foi um Deus nos acuda! O prejuízo que o 5S nos causou, com o desaparecimento de documentos importantes, saiu mais caro do que o que a consultoria cobrou pra implantar o PQT. PQP!
Seus documentos de estimação, você tinha de manter trancafiados, porque se um fiscal do PQT os visse dando bobeira sobre a mesa, caía babando em cima e jogava no lixo, como se fosse papel contaminado com lepra. Numa dessas, jogaram fora todos os mapas de afloramentos, feitos a mão, de um dos mais importantes projetos da Superintendência de Recife. Um horror!
E tinha também a avaliação do cumprimento de metas, GDP, feita ao vivo pelo seu chefe, na sua cara. Maior barato! Depois do discurso, o chefe dizia que você, apesar de todas aquelas qualidades que ele ressaltou, precisava se esforçar um pouco mais, em prol da equipe e que somos um time e que tinha certeza de que você iria melhorar e etc e tal. E você podia discordar à vontade, desde que concordasse com tudo o que ele dissera.
Aí o gerente marcou com Zanata (nome fictício):
- Amanhã, às 8h00, venha à minha sala para seu GDP.
Extremamente desconfiado e ressabiado com o andar da carruagem, o geofísico Zanata se apresenta, com pontualidade britânica, a seu amado chefe. Após os cordiais cumprimentos e o cafezinho especial, o chefe chama pro serviço:
- Então? Podemos começar?
- Pois não! Só um momentinho...
Pra espanto do chefe, Zanata tira da capanga de couro um pequeno gravador, a pilha, liga o dito cujo e o posiciona sobre a mesa, voltado para o gerente, em tom decidido:
- Atenção! Gravando! Ok, vamos lá...
O chefe se indigna e do alto de sua autoridade, aperta o botão stop:
- O que é isso Zanata? Uma brincadeira?
- Não doutor. É que eu quero usar o que vou ouvir aqui hoje, como fonte de reflexão, pensando em minha melhoria futura.
- Negativo! Recuso-me a ser gravado. Isso é um desrespeito!
Zanata, calmamente, levantou-se, recolheu o gravador para a capanga, de onde nunca deveria ter saído, olhou fixamente nos olhos do chefe e disse, as palavras lhe saindo quase das pontas dos dedos em riste:
- Pois se o senhor tem medo de suas próprias palavras, quanto mais eu, doutor! Hasta la vista baby!
E saiu, tranqüilo e calmo, para estupefação do chefe, engasgado num silêncio embaraçoso.
Se ele foi avaliado, em outra oportunidade? Não sei. Sei que ele espalhou pra todo mundo que o chefe era medroso e o chefe espalhou que ele era doido e no fim ficaram todos felizes.

Um comentário:

Anônimo disse...

Excelente... as empresas brasileiras não perceberam ainda que nem sempre as soluções mirabolantes, do primeiro mundo, atendem nossas demandas... e aí acabam viabilizando a implantação de programas (pacotes) sem nenhum cuidado em, pelo menos, customizá-los com nossa realidade cultural.
Esta falta de visão, acarreta altos custos (não investimentos) sem que se possa identificar a solução das nossas principais questões no campo organizacional e comportamental.
O causo do GDP, contado de forma divertida e bem humorada, demonstra, claramente, a ausência total de preparo da grande maioria dos gestores em atuar como verdadeiros líderes.. a creibilidade, tanto do gestor quanto do próprio programa fica ferida de morte. E a situação vai se repetindo, em várias empresas, enquanto os tecnocratas fazem belos discursos das técnicas modernas de Gestão de Pessoas..."A prática é o critério da verdade".

Gostaria, por último, pedir autorização para contar o causo do GDP por ocasião em que eu estiver ministrando treinamento para avaliadores de desempenho..
Um ponto importante..o GDP é uma ferramenta gerencial excelente... mas precisa ser usado por quem estiver preparado.. um verdadeiro lider.
Foi um prazer fazer um comentário sobre o tema.