domingo, agosto 17, 2008

Cinzas

Vamos lá!
Último tango, último trago...
O furacão que nos varreu um dia,
Hoje é só poeira.
Findo o carnaval,
Finda a fantasia,
Fica o gosto amargo
Da manhã de cinzas
Da quarta-feira.

E a minha vida é esta.
Uma fogueira me queimou por dentro,
Um tsunami fez de mim seu epicentro
E tudo devastou...
Eis o que resta.
Nosso amor, abandonado,
Agonizou no chão, ignorado,
Triste fim de festa!
Em vão te supliquei... Estavas bêbada.
De braços com o Palhaço... Trôpega,
Esqueceste o Arlequim tristonho,
Seu olhar pidão, seu canto enfadonho,
Sua vã seresta.
E então te foste, na clara manhã...
Nem viste o bobo nas calçadas da cidade
A rabiscar no chão sua saudade.
Nem o viste chorar, cruel cunhã!

Distraída,
Nem ouviste seu canto de dor.
Tu, a musa de todas as musas,
Que inspiraste os mais puros poemas,
Tu, a fonte de todos os temas,
Te perdeste nas ruas confusas
Da cidade sonolenta, sem cor.

Distraída,
Não o viste pisar a poesia,
Sob o céu de luz rajado,
E tristemente, esbanjar alegria,
Lançar serpentina e dançar...
Nem o sentiste exalar
Bêbado ai resignado.
Nem o viste a cantar, resoluto,
Apesar da dor e da careta,
Senhor de si, absoluto:
"Deixa a vida me levar..."
Seguindo gentil Borboleta.
Ah! Pena... Nem o viste
A se esgoelar na praça,
Sambando com as morenas,
As derradeiras Helenas
Do Bloco do “Tudo Passa”,
A cantar um samba-chiste:

- Aqui jaz um grande amor.
Levou para a eternidade
Os clarins de um carnaval
Que viveu intensamente
Em traição e poesia...
Agonizou quarta-feira,
De ressaca, indiferente,
Causa mortis natural,
Vomitando a fantasia...
Sem remorso, sem saudade.

Bsb, 03/08/2009